terça-feira, 3 de agosto de 2010

O PSD E OS SINDICATOS

Há muito que aqui não escrevia, mas há alturas em que é impossível não fazer nada, sob pena de cumplicidade.
Antes de mais queria deixar claro que tenho, entre os TSDs (Trabalhadores Social-Democratas) muitos amigos, para além de outras pessoas que, apesar de não manter com elas relações de amizade pessoal, muito admiro e respeito.
Não gostaria, por isso, de estar na pele deles nos tempos que correm.
Na realidade torna-se cada vez mais claro que com a subida ao poder de Passos Coelho abriu a caça aos sindicalistas no PSD.
A recente proposta de revisão constitucional por ele apresentada e que a maioria da comunicação social centrou quase só na questão dos poderes presidenciais, tinha contornos muito mais graves que, no limite, conduziriam ao fim da concertação social.
Claro que ele, ao ver o resultado prático das suas intenções até aí inconfessadas (tivesse ele apresentado os seus planos em toda a sua crueza no Congresso e quero acreditar que não teria ganho a liderança do Partido) imediatamente veio dizer que era apenas uma "Proposta". Pois... A proposta de maior ataque ao Estado Social a que se assistiu após o 25 de Abril.
Compreende-se a incomodidade dos TSDs. Estranha-se o seu silêncio.
E mais se estranha ainda o silêncio perante a prática que aos poucos se vem instalando na estratégia do PSD na sua relação com os sindicatos.
De início o PSD, então ainda PPD, esteve na rua, juntamente com os seus militantes sindicalistas, naquela que foi uma das batalhas decisivas pela democracia em Portugal, a luta contra a unicidade sindical na lei, contra o modelo soviético de "sindicalismo" dependente do "Partidão".
A batalha foi ganha. O PSD, com toda a justiça, colheu a sua parte de louros nessa vitória e os seus militantes sindicalistas, quase todos orgtanizados nos TSDs, na sua grande maioria engrossaram os sindicatos democráticos, ajudando a criar e integrando a Direcção da UGT, da qual aliás sempre detiveram a Presidência.
E durante muitos anos o PSD dividia os sindicatos em 2 categorias: de um lado os sindicatos democráticos, aqueles que recusavam o modelo de correia de transmissão do PCP e que reconheciam o direito à tendência e a liberdade de expressão dentro do sindicato, com respeito pelas minorias, e do outro lado os sindicatos não democráticos.
No entanto, nos últimos anos, sobretudo após a subida de Manuela Ferreira Leite à liderança do PSD começou a verificar-se um fenómeno estranho: Para o PSD os sindicatos continuaram a estar divididos em 2 categorias, mas já não em função da sua orgânica e prática sindical democrática. O que passou a distinguir os sindicatos "bons" dos sindicatos "maus" para o PSD foi o facto de, em determinado momento, poderem ser "aliados" na sua luta contra o PS e os seus governos.
E com esta (des)orientação começou a assistir-se a episódios no mínimo bizarros.
Por exemplo, durante a luta do PSD contra a ministra Maria de Lurdes Rodrigues, o PSD elevou à categoria de quase herói nacional o líder da FENPROF, o dirigente comunista Mário Nogueira. O mesmo que se tinha distinguido anos antes na luta contra o modelo de avaliação da então ministra da Educação do governo do PSD... a Dra. Manuela Ferreira Leite. E é bom que se note que Mário Nogueira não mudou de práticas, nem de pensamento. Quem mudou foi o PSD. Aliás nem sequer mudou a atitude de Mário Nogueira e da Fenprof perante os sindicalistas democratas, muitos deles TSDs, que continuam a ser maltratados por ele e pelos seus apaniguados perante o "olhar distraído para o lado" do PSD.
E daí para a frente foi o extremar desta nova atittude. Para a direcção do PSD passaram a existir como sindicatos apenas aqueles que se distinguem  na luta contra o governo socialista, na acção reivindicativa de rua, nas manifestações, nas acções que tantas vezes arrastam os trabalhadores para becos sem saída. Os outros, aqueles que continuam empenhados num sindicalismo responsável, que busca soluções e saídas através do diálogo e da concertação, passaram a ser considerados pela direcção do PSD como "nãodicatos". E pouco lhe interessa o trabalho sério que muitos e dedicados TSDs desenvolvem nessas estruturas.
É a estratégia do "Quanto Pior, Melhor!"
E, deliberadamente ou não, a sua estratégia converge com a do PCP. O que é um perigo, sobretudo para a democracia.
Porque o PCP não pode ter outra estratégia pois sabe que nunca alcançará o poder por via democrática, por eleições.
Mas o PSD aspira, e legitimamente, a voltar ao poder, por via legal, por eleições. E quando isso acontecer terá um país para governar, num quadro democrático, onde os sindicatos, espera-se, terão um lugar importante no desenvolvimento do diálogo social. E quem serão os interlocutores sindicais do PSD nessa altura? Os sindicatos do PCP que eles agora "endeusam" e que, obviamente, continuarão na mesma senda que seguem hoje?
A convergência com o PCP atinge mesmo contornos ainda mais perigosos.
Seria bom refrescar algumas memórias e lembrar que, logo em 74 e 75, o PCP, consciente de que nunca jogaria lealmente o jogo democrático, após ter percebido que nunca subiria ao poder por eleições livres e democráticas, tratou de pôr em prática  a teoria do "entrismo", bem definida por alguns dos mais célebres teóricos leninistas. Tratava-se de infiltrar, nos Ministérios mais importantes para os seus objectivos, muitos militantes comunistas que, ao longo dos anos iriam garantir um controlo efectivo de muito do quotidiano desses mesmos Ministérios. A série de humor inglesa "Sim senhor Ministro" mostrou-nos, com um humor inteligente, que quem manda verdadeiramente nos Ministérios não são Ministros nem Secretários de Estado, mas sim os "Sir Humphreys" desses ministérios. Ora para o PCP, na impossibilidade de colocarem Ministros ou Secretários de Estado tornava-se urgente infiltrar muitos potenciais "aparelhistas" nos "aparelhos" dos Ministérios.
Foi o que fez nalguns Ministérios "mais permeáveis" e escolhidos a dedo por razões estratégicas: Educação, Saúde, Trabalho, Justiça.
Não adianta negar. Todos os conhecemos.
E todos conhecemos, também, os sindicatos que se têm distinguido num "corporativismo" eivado de espírito "de casta". Nalguns deles têm-se distinguido exactamente alguns desses "aparelhistas". O que não pode espantar ninguém.
É bem sabido que um estalinista "não muda de ideias, apenas muda de patrão".
Já me espanta que o PSD, ao arrepio da sua história e prática, aceite ser o novo patrão desses  "trânsfugas".
Veja-se o recente exemplo do Sindicato dos Magistrados e da atitude do PSD.
É um dos sindicatos mais classistas que se conhece.
A sua história é mais rechedada de "factos políticos" que de "fenómenos sindicais".
Não se tem distinguido pela democreatização de coisa nenhuma.
Tem-se calado perante a "judicialização" da política em Portugal.
Não se tem empenhado na proposta de soluções práticas para acabar com os atrasos na justiça ou qualquer outra das muitas chagas que afectam a justiça em Portugal.
Ora é a este sindicato que a Direcção do PSD surge a tecer loas e a "defender", não se sabe de quê nem de quem, apenas por este, numa atitude de parasitismo dos factos políticos a que há muito nos habituou, vir tomar uma posição (mais uma vez política e não sindical) sobre o caso Freeport.
Começa a ficar claro que para esta direcção do PSD "Vale tudo, ATÉ tirar olhos!".
Será que entre os meus amigos TSDs, sobretudo entre os mais antigos, entre aqueles que se empenharam a sério na luta sindical, velhos e corajosos activistas sindicais, não haverá quem tente explicar a estes "jovens turcos" que tomaram a direcção do PSD qual a verdadeira natureza e face deste sindicato e de outros afins? Nem quem lhes explique qual a atitude que este e outros sindicatos tomaram no passado quando estavam em causa dirigentes do PSD, por exemplo Leonor Beleza, ou João de Deus Pinheiro, (para não falar do próprio Sá Carneiro)?
É que com esta política do "Vale tudo até tirar olhos", se ninguém lhos abre, arrisca-se a, se e quando alcançar o poder, ver os seus pretensos aliados de hoje tirarem-lhe os olhos à primeira oportunidade.
E ele merece.
Só que, em  nome dos superiores interesses da democracia e da sua imprescindível estabilidade, preferia que isso não acontecesse.
Assim como, em nome desses mesmos interesses, não gostaria que os TSD perdessem o seu lugar e papel no seio do PSD.