Cada vez mais lhe é difícil conciliar a "esquerda caviar" na qual se sente como peixe (talvez esturjão) na água, com as vagas de esquerda "torresmos embrulhados em papel de seda" que contra ele arremetem no seu Bloco.
Era-lhe muito difícil explicar o apoio ao candidato Alegre que aparentemente até parecia estar nos antípodas da linha dominante (se é que isso existe) no Bloco. Caçador inveterado, aficionado confesso de touradas, defensor da pluralidade sindical, e acima de tudo (brrrrr!!!, Credo, cruzes, canhoto!) militante do Partido Socialista! Mas tinha um milhão de votos! (pensava Anacleto!)
Por isso, como bom educador da classe operária, num trejeito estalinista (tanto mais de louvar quanto vindo de um ex-Leonino Trotsky) decidiu o apoio em bloco, do Bloco, ao candidato Alegre!
E já se imaginava, bucólico, a passear nos jardins de Belém como Chefe da Casa Civil. Aliás trataria logo de acabar com a Casa Militar.
Mas o povo, sempre o mesmo ingrato, não quis assim. E o Anacleto do Alegre se fez Triste.
Anacleto, no seu polo Lacoste genuíno, mas a que mandou coser o crocodilo ao contrário para parecer de contrafacção, pensou rápido...
Havia que explorar o ter ficado à frente do candidato do PC, aquele senhor que ninguém conhecia, nem ele próprio. Podia ser que o 2º lugar ainda desse acesso às competições europeias...
Mas entretanto, a Praça Tahrir do Bloco começava a encher-se de berloquistas da mais revolucionária cepa, verdadeiro carrascão da revolução, inimigos jurados da Cabernet-Sauvignon do Anacleto, mesmo que misturada com "Rabo de Ovelha" (e de Carneiro porque no Bloco são muito criteriosos nisto do género) e com um cheirinho de Trincadeira na Direita.
E foi assim que, Mubarakiantemente, Francisco Anacleto, após ouvir todos aqueles em quem confia no Bloco (frente ao espelho com que se barbeia todas as manhãs) sacou da sua cartola (mascarada de boina basca) o seu Coelho Continental (para não confundir com o madeirense): A Moção de Censura!
A opção era clara: Ou avançava com esta Moção de Censura ao Governo, já que não pode avançar com uma Moção de Censura ao povo que não percebeu a sua escolha, que não se deixou guiar por quem está naturalmente fadado para o fazer, ou seria ele próprio censurado no seu mais que nunca partido.
Era a forma de Anacleto fazer soar no seu partido as "proletárias vovuzelas" do toque a Reunir (em torno dele, claro).
Ou seja e agora falando a sério, esta Moção de Censura é uma mera inciativa para consumo interno do Bloco, uma "prova de vida à esquerda" de Francisco Anacleto, tentando antecipar-se aqueles que no seu Partido estão a preparar-se para partir a Louçã toda!
A não ser que...
A não ser que os sectores mais "bloqueados" do PSD, com os principais inimigos de Passos Coelho (quiçá com Cavaco) à cabeça, cedam à tentação de subir a todo o custo para o combóio do poder e decidam apoiar a moção. (A alternativa, meramente académica, seria o golpe de teatro do próprio PS viabilizar a moção e dizer-lhes que já que têm tantas ideias então que tomem as rédeas do poder e mostrem a verdadeira cara, o que, obviamente, não irá acontecer).
Nesse caso, o Bloco acabaria por cumprir aquilo que muitos consideram ser o seu único papel histórico, o de ser o PRD do século XXI.
A memória dos peixinhos vermelhos, dizem os biólogos, é de 6 segundos. A do Bloco, digo eu, não ultrapassa uma legislatura.
No passado vociferaram contra os governos de Guterres, a que acusaram de serem governos de direita, cuja queda só traria vantagens ao país e aos trabalhadores. Seguiu-se-lhe Santana Lopes e aí sim viram o que era um governo de direita e as suas políticas. Claro que até hoje nenhum bloquista me conseguiu dar um único exemplo de alguma melhoria trazida pelo governo Santana Lopes aos trabalhadores, de que o Bloco se afirma, reafirma e clama e proclama ser o mais lídimo defensor!
O mesmo se irá passar se o Governo do Partido Socialista for substituído por um governo do PSD, pois a receita de Passos Coelho é clara e ele não a esconde: liberalização dos despedimentos individuais, despedimentos e mais cortes salariais na Função Pública, cortes salariais na privada, ataque frontal à Escola Pública, despedimento de professores, fim do SNS, etc, etc, enfim, a agenda liberal em todo o seu esplendor.
É esta a caixa de Pandora que, para salvar o seu pescoço, Francisco Anacleto está disposto a abrir, o que, para muitos sectores do Bloco, adeptos confessos do "quanto pior melhor", é perfeitamente legítimo.
Ou então é só infantilidade política.