Após uma relativamente grande ausência motivada por gripes familiares, viagens de trabalho e pura preguiça intelectual aqui estou de novo a comentar para mim próprio o país e o mundo em que vivo, numa perspectiva que pretendo de esquerda.
E regresso um pouco bilioso. Estou no Luxemburgo e o único jornal português visível num quiosque é o Jornal de Notícias. E nele são dadas mais umas linhas de visibilidade a uma personagem que me provoca um verdadeiro asco intelectual, o Medina Carreira!
Igual a si próprio persegue a aspiração de entrar para o Guiness Book of Records como o ser que mais mal-dizer (já que lhe falta a dimensão intelectual para o escárnio) consegue produzir sobre o maior número de pessoas e políticas em menor tempo.
E nesta edição do JN dá mais um passo de gigante nesse sentido. A convite de outra maldizente encartada, a Fátima Campos Ferreira, foi ao Casino da Figueira da Foz vomitar um jackpot de invectivas lapidares e (pre)juízos de valor sobre tudo e todos mas, claro, com especial predilecção para o Governo do PS, para a Assembleia da República e para os políticos em geral.
No mesmo jornal consegue chamar "trafulhice" ao Programa Novas Oportunidades, "mentira" à medida proposta de alargamento da escolaridade obrigatória até ao 12º ano, "mentirosos e incompetentes" aos membros do Governo, e aos estudantes apelidou-os de "cambada, de 14, 16, 20 anos que anda por aí à solta" e de "tropa fandanga".
Mas não se ficou por aí. Do alto da sua insuportável arrogância classificou os deputados de "obedientes e escravozitos", o sistema eleitoral de "saco de gatos" e a Assembleia da República de "construção caduca", comparando-a mesmo à Assembleia Nacional de Salazar.
Mas só quem andar distraído pode ficar chocado com a diarreia verbal deste ancião que teima em vestir calções à inteligência para parecer um enfant-terrible.
Sim, é o mesmo Medina Carreira que um dia disse que os portugueses "deviam voltar a andar de burro como os avós!" ou que "os políticos usam o país como uma manjedoura." Que afirmou nunca ter preenchido uma reclamação porque não perde tempo com inutilidades (grande sentido cívico). E que não tem qualquer pudor em dizer coisas como "Salazar liquidou duas gerações e a democracia está a liquidar quatro" ou "Não há soluções e quem não disser isso é trafulha."
Mas para Medina Carreira não há gente competente neste país? Claro que há! Veja-se a sua frase lapidar de que "Se a minha voz fosse respeitada não se andavam a fazer estas burrices" Claro que ao proferi-la se esqueceu do que ele próprio tinha dito ao "Expresso" a 24 de Outubro: "Mesmo um sábio, um compositor, um génio tem de ser modesto. A imodéstia é um sintoma de estupidez. " Por uma vez estou de acordo com ele.
Mas será que não tem razão em nada do que diz? Claro que terá... Até um relógio parado está certo 2 vezes por dia. E ele dispara em tantas direcções que há-de acertar em algo que mexa!
Mário Soares chamou-lhe um dia a "Cassandra Lusitana". Infeliz comparação já que a Cassandra previu a destruição de Tróia e acertou. Medina Carreira prevê a destruição de tudo a não ser que o elevassem oficialmente a "Salvador da Pátria". Confessa-se um adepto do presidencialismo, só não diz que o Presidente, o Sidónio dos tempos modernos, só podia ser ele.
E não deixa de ser curioso lembrar que quem tanto mal diz dos governos do pós 25 de Abril tenha sido subsecretário de Estado do Orçamento e mais tarde Ministro das Finanças. Porque não aproveitou para "salvar o mundo nessa altura"? Salazar também começou por aí...
E é igualmente curioso (mas politicamente muito relevante e revelador) o facto deste "racha-políticos" ter de forma bem clara e pública apoiado Cavaco Silva aquando das eleições presidenciais... É que o candidato não tem mesmo nada em comum com a imagem de político que Carreira diz defender...
Mas não quero ser eu a tentar dissecar este Carreirismo.
Apenas quero dizer que isto vem provar algo que disse há algum tempo quando um amigo me disse que, para discutir a esquerda era preciso ouvir homens de esquerda como Medina Carreira. Respondi na altura que o bota-abaixismo, a arrogância intelectual de uma pretensa "superioridade moral e/ou intelectual" (mesmo quando alicerçada em critérios tão bacocos como a educação espartana dos Pupilos do Exército - a Manuela Ferreira Leite terá andado no Colégio de Odivelas?? ), uma visão paternalista e de certa forma afectadamente Queirosiana, militantemente pessimista, não é, nem nunca será, uma atitude de esquerda.
Medina Carreira não é um homem de esquerda. É apenas e só um ressaibiado! E pouco me interessa o quadrante do seu ressaibiamento. Algumas das coisas que hoje defende não deveriam ser defendidas pela esquerda moderna? Claro que deviam. Mas no dia em que essa esquerda tiver oportunidade de as pôr em prática, Medina Carreira virá a público contradizer-se e dizer que não prestam.
É que este homem se tivesse a boca um pouco maior seria um sério candidato a substituir a Manuela Moura Guedes no Jornal de Sábado da TVI!